Este texto é uma anotação no meu diário. Depois de escrevê-lo, dei ao meu filho como um modo de dizer: "- Eu respeito o que você gosta! Obrigada por me respeitar também!"
Ninguém a minha volta me perguntou o que eu pensava sobre, mas todos eram unânimes em dizer que eu deveria ser radical perante as escolhas de meu filho quanto à música e o modo como se veste. Em nenhum momento ninguém questionou consigo mesmo se eu não me pegava constantemente pensando sobre o assunto e antes que eu chegasse a uma conclusão, aprofundei-me mais na posição destas pessoas que palpitavam, pois considerei bem mais grave que as escolhas de meu filho. O que estava em pauta não era a opção sexual dele, ou alguma desconfiança quanto a ele estar usando álcool ou drogas, ou ainda se ele andava com más companhias... Ninguém parecia levar isso em conta e sentiam-se incomodados (e não preocupados) apenas com o tipo de música que ouvia e suas roupas. Então, me permiti compreender o universo adolescente de meu filho depois, ao constatar que havia um problema sim, com as pessoas a nossa volta.
Ouvir Restart e Cine o dia inteiro não é sinal de problema algum... Usar roupas coloridas e acessórios nada discretos também não... Mas criticar a escolha dos outros e considerá-las erradas só porque não é a mesma escolha que você teria, isso sim é sinal de algo muito errado. Não sei dizer se isso é parte da natureza humana ou se ao longo dos processos de mudanças pelo mundo, o ser humano foi tornando-se assim... O fato é que muita gente anda como se usasse um cabresto nos olhos que lhes faz enxergar apenas uma direção e isso nem sempre quer dizer que a pessoa olhe para frente...
Os adultos dominam o mundo e todas as decisões que regem a sociedade são escolhidas por eles. As crianças já não conseguem ser poupadas de nenhum tipo de violência sendo que a primeira cometida contra elas é jamais acreditar nas coisas que só elas podem ver. De repente, um infeliz faz um discurso e grita que as crianças são o futuro de uma nação e me escondo de vergonha! Pois nós, adultos, destruímos pouco a pouco o mundo para deixar os bagaços e os cacos para as futuras gerações que terão que se virar para consertar tudo. E os adolescentes que estão no difícil dilema de abandonar a delícia de ser criança para obrigatoriamente tornarem-se os adultos que supostamente cuidam do mundo, prefeririam ser adolescentes pra sempre! E num momento em que as obras das mãos dos adultos parecem ser as piores possíveis, os adolescentes criaram algo para se apegar, para manter sua visão de mundo maravilhoso, para preservar a criança que ainda está neles e assim quem sabe, conseguirem ser adultos melhores do que fomos...
Realmente as pessoas precisam mais de 'Deus' e de todas as virtudes que a crença Nele desencadeia. Uma dessas virtudes, que deveria ser essencial em todas as áreas de nossa existência é o respeito mútuo.
Muita gente parece não compreender que respeitar a opção do outro não é confessar que escolheu a mesma coisa... Talvez, em alguns casos, pode querer dizer que gostaria de escolher mas não tem coragem para tanto. Mas, aceitar as escolhas de outra pessoa é apenas respeitar o modo como ela determinou viver. Não estou falando de escolher uma vida marginal e desregrada, essa é outra discussão. As críticas vêm de todos os lados sobre coisas simples que são direito de todos. Escolhas que temos que fazer diariamente não estão sendo poupadas das críticas dos hipócritas e isso é reflexo de algo muito sério... De uma distorção no modo como muitas pessoas estão enxergando o mundo e o outro.
Antes de escolhermos algo para ser acrescentado a nossa vida nos identificamos com aquilo Sem identificação, sem considerar algo parecido conosco, não tornamos algo aceito muito menos desejamos ter como parte de nós. É esse ponto que determina o direito de receber respeito pela escolha feita. Ao escolhermos uma roupa, uma música, um carro, uma casa, um lugar, nos guiamos pela identificação. Mesmo que inconscientemente, precisamos nos ver em algo para que esse algo seja recebido por nós. Não nos agrada possuir aquilo que não gostamos... Ninguém desembolsa dinheiro da própria carteira numa loja para adquirir algo que não possui nenhum tipo de apreciação...
O dilema não é ter opinião sobre a preferência musical de meu filho... É que postura tomar diante de uma pessoa que acredita que ele está perdido apenas porque gosta de uma banda adolescente. Como reagir diante de quem acredita que devo utilizar a censura e determinar o que ele deve ouvir ou usar só porque não gosta da mesma coisa? Deverei correr o risco de perder meu tempo e saliva e explicar-lhe sua falta de respeito ou mudar de assunto bruscamente ignorando sua opinião? Até que ponto eu também não faltarei com o respeito?
Olho para meu filho que é uma mistura de rock in roll, hippie e new have... Entro no universo dele que é tão musical e colorido! Olho como ele descombina as peças de roupa que usa e como as cores nada têm haver com as peças ou com as outras cores... Olho o óculos colorido que me permitiria encontrá-lo com facilidade em meio a uma multidão... E me lembro como sou apaixonada por tudo que é multicolorido: caixa com lápis de cor, linha para crochê multicor, arco-íris, peixes coloridos mistos num aquário, palheta de pintura, os livros na estante cada um com a capa de uma cor... Também gosto demais de tudo que é colorido e a diferença de mim para meu filho é que ele é capaz de exteriorizar esse gosto, eu não: pareço um mistério cinza! Quando ele exterioriza parece a fonte de um arco-íris!
Eu não gostava de Restart, mas com meu filho aprendi a ouvir. Respeitei a escolha dele que é muito melhor do que ver seu filho curtindo um funk cantado por membros do PCC! Não gosto da banda colorida tanto quanto gosto dos Beatles, mas meu filho aprendeu comigo a gostar muito de yeah,yeah,yeah! Descobri então que não é que gosto de Restart, estou apenas aberta para que meu filho compartilhe comigo aquilo que ele gosta e isso é recíproco!
A grande maioria dos meus ídolos estão mortos e só um ainda vive. Quando surgiu a oportunidade de vê-lo e ouvir sua voz sem ser pela reprodução de um cd, não conseguia caber em mim. No dia do show eu gritava, urrava, perdi o senso e a razão e estava quase arrancando os cabelos (os meus e dos outros perto de mim). Foi só então que compreendi meu filho. Foi só então que compreendi que Einstein, Freud, Sócrates, Lennon, Harrison, Jung são meus ídolos mortos junto com meu passado e os ídolos de meu filho estão vivos e fazem parte da geração dele que se choca com minha tão rebelde.
Então, chego sem querer a conclusão das duas questões e penso que muita opinião por ai é reflexo de muitas outras como um fio de meada... Há outra coisa no mundo pouco respeitada e que ninguém pode mudar... As religiões, os partidos políticos, as torcidas organizadas, os uniformes escolares, as empresas, as casas, as pedras preciosas, tudo a nossa volta é reconhecido pela cor e a cor determina o reconhecimento sobre o que são. Inclusive as peles, as raças, as culturas!
Ah! Obrigada, Criador de todas as coisas por ser tão generoso e não ter economizado nas cores: a Natureza é tão bela colorida assim! Obrigada por não limitar nossa visão apenas ao branco e preto!
Ah! Se o mundo não fosse tão dividido! Se a Ásia não fosse tão amarela, as regiões indígenas tão vermelhas, a Europa tão branca e a África tão negra... Ah! Se não fossem esses tantos muros construídos por cada um de nós! O mundo todo seria tão colorido!
Dê um Restart nas idéias! de Shimada Coelho é licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported.
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