Entra afoito o Conselheiro pelo corredor principal onde encontra o Imperador deliciando-se de frutas vermelhas colocadas gentilmente em sua boca por belas cortesãs:
- Majestade! Majestade! Perdoe-me interrompê-lo em seu momento de intensa reflexão! Bem sei, meu senhor, que seus pensamentos estão absortos em soluções e melhorias para nosso reino, mas o motivo que me trás até sua presença é de suma importância! Pensei muito antes de vir perturbá-lo com tal banalidade, mas preocupa-me se o motivo que me trás não se transforme em uma preocupação maior para Vossa Majestade!Perdoe-me minha inferior capacidade em resolver questões, meu senhor... Necessito de tua sabedoria!
- Ora, ora, caro Politicanus, porque de tanto drama! Estás bom para atuar nos Teatros Gregos!Se é uma questão banal, por que me importunas? Faça qualquer coisa e estará de bom tamanho!
- Meu glorioso senhor, eu creio que qualquer coisa não caberá a este momento tão desagradável à Vossa Senhoria!
Revirando os olhos para cima, olha para o Conselheiro como se de seus olhos saíssem raios fulminantes:
- Perdeste a noção, Politicanus! Vomite logo e acabe com isso de uma vez! Estás a me tentar? Desejas ser executado em praça pública?
Mais que depressa o Conselheiro começa a falar:
- Perdoe-me, meu senhor, perdoe-me! Mas uma turba caminha em direção ao palácio feito um enorme Tsunami! Pelo que pude ver, todos os aldeões estão presentes nesse mar de gente!
- Sei, sei... Alguma festividade? Arrumaram uma distração?
O Conselheiro balbuciou tremendo de medo:
- Creio que não seja, senhor... Eles gritam e parecem bem nervosos! Temo pela Vossa vida, ó senhor de todos!
- Olha aqui, Politicanus! Você chegou exatamente no momento em que partiríamos para o próximo estágio de nosso ritual romântico! Diga logo a que veio e volte pelo caminho que vieste, homem!
- O que dizem senhor, é confuso, pois bradam coisas diferentes ao mesmo tempo! Mas exigem melhorias...
O Imperador arregala os olhos, retira suas pernas que descansavam no apoio dos braços do trono onde bateu as mãos e sentou-se voltado para o franzino Conselheiro:
- Quem essa ralé pensa que é? Será que nunca sossegarão no lugar deles? Melhorias... Que melhorias? Eles não sabem ainda que devem viver e servir a mim e só a mim? Esse povo reclama de barriga cheia! Diga logo, melhorias em que?
- Uns gritam que exigem empregos e outros exigem melhores condições de trabalho... Uns gritam que não há médicos embora haja muitos hospitais e outros gritam que querem ser melhor atendidos... Há ainda os que gritam querendo segurança pedindo 'chega de violência'... Outros ainda exigem escolas para todos... E ainda tem...
- Chega, Politicanus! Chega! Já sei o tamanho da lorota!Que os deuses fulminem essa raça! Eles não sabem o que querem, são uns bandos de arruaceiros! Trabalho? Muitos pelo mundo dariam tudo para viver sem trabalho! Onde já se viu tamanha aberração: condições de trabalho? Não trabalham reclamam, estão trabalhando há do que reclamar! Se eles estudam reclamam, se não estudam reclamam! Estudo é para nossa elite que não suporta viver no ócio! Precisam se ocupar! Mas a ralé? Já estão acostumados a jogar tempo fora! Convoque os guardas e coloque-os para correr daqui! - disse no tom de tamanho descaso, voltado a levantar as pernas e aconchegar-se em seu trono.
- Para poupar-lhe tamanho aborrecimento, meu senhor, essa providência já foi tomada, mas a multidão é tamanha que não estão conseguindo conte-la!
- Hum... Parecem determinados?
- Pelo modo que enfrentaram os guardas, creio que sim, meu senhor!
- Não posso atendê-los, Politicanus... Além do trabalho que me daria, teria que convocar todo o Senado e a maioria está em viagem... Demoraria dias e tenho uma vida pra viver em vez de esperar pelos outros! A quantidade de verbas que perderíamos estimulando as empresas seria demais e pouco restaria para nós neste ano...
O Conselheiro ouve um estrondo e segue para a sacada onde pode ver os guardas tentando conter o imenso portão:
- Excelência, o povo tenta derrubar os portões e pretendem invadir...
Segurando o queixo da moçoila que acaba de colocar-lhe na boca um suculento morango, mastiga com calma e responde:
- Lembra-te Politicanus, da viagem que fiz à Roma? Aquela que anunciamos ao povo que seria para expandir nosso mercado internacional? Que não nos ouça, mas foi a única desculpa que consegui naquele momento! Não me arrependo de cada tostão nem de cada segundo ali! As cortesãs romanas são habilidosas...
- Sim, Excelência, sim... - respondia demonstrando bastante ansiedade e pressa, o Conselheiro.
- Em meu passeio turístico por Roma, Domiciano mostrou-me uma das obras que seu pai Vespasiano iniciou e já está terminada!
- Majestade, bem sabes como me causa enorme prazer ouvir suas palavras de rica sabedoria, mas logo o povo derrubará os portões!
- Não me apresse, Politicanus, e acalma-te! Sua petulância e ignorância provam porque sou eu e não você que está sentado neste trono! Como eu dizia... Aparentemente é apenas mais um monumento exuberante de Roma, mas mal sabem que se trata da mais engenhosa tática política já realizada! Faremos o mesmo, mas precisaremos fazer algumas mudanças no projeto, pois não quero ser acusado de plágio! Como deves saber, Politicanus, no mundo nada se inventa, tudo se copia! Mas não me agradaria saber que alguém venha pensar que não sou capaz de ter minhas próprias idéias e preciso copiar a dos outros...
O Imperador levantou-se, suas cortesãs ajeitaram sua roupa. Ele pediu a coroa e o cetro e dirigiu-se até a sacada, onde gritou:
- Soldados! Quanta insolência! É assim que tratam o povo a quem dedico minha vida? Abram os portões e deixem meu povo entrar!
Por um instante o povo acalmou-se um pouco surpreso com as palavras firmes do Imperador. Baixaram suas foices e varas e entraram civilizadamente, parando abaixo da sacada.
- Povo meu! Já trouxeram até mim o lamento que atormenta seus corações conturbados! Aquietai-vos, pois sou vosso rei: cuidarei de suas necessidades! Como bom rei que sou, já tenho comigo a solução de vossos problemas. Apenas peço-vos que tenhais paciência, só um pouco mais! Em breve, todos os vossos problemas terão um fim!
O povo eufórico voltou a levantar as varas e foices, mas agora num brado de regozijo e celebração. O Imperador acenou a todos, deu meia volta e entrou já com outra fisionomia:
- Vá Conselheiro! Convoque todos os engenheiros! Precisamos iniciar já a construção de um monumento!
- Que sábia decisão, Majestade! Uma construção de monumento de certo irá empregar vários cidadãos além de beneficiar outras áreas e...
- Não, Politicanus! Deixa de ser incompetente! A solução tomará proporções bem maiores que essa sua cabecinha de vento pode conceber! Resolverá muito de nossos problemas em longo prazo!Obviamente, boa parte desse povinho se aquietará, mas para o restante já tenho outra solução! Vamos nos focar a princípio no monumento...
- Será um monumento à sua honra, digníssimo? Um novo jardim? Outro palácio?
- Cala-te e vá logo fazer o que ordenei, Politicanus! Só iremos construir algo parecido com o Coliseu dos Romanos, mas este se chamará Estádio! Daremos comida e diversão e todos os nossos problemas cessarão!
A conversas entre Praesiderus e Politicanus - I de Shimada Coelho é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Vedada a criação de obras derivadas 3.0 Unported.
Tu e teus belos escritos Rita! Cada vez melhor...
ResponderExcluirPassando para te ler e deixar um abraço com muita paz e luz! Bom domingo! Ro