Destaque para outras Almas Nuas

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Sentidos



“A cotovia (autorretrato)“, feita em 1989 por Heinrich Vogeler


"As palavras da Sabedoria me abandonaram... Os grandes olhos expressivos já não estão mais sobre mim... Acabei de cair e me encontro na mais sombria de todas as escuridões. Não há nada mais abaixo...

O mundo brada por misericórdia e o que há para ser dito? Nada. O que pode ser feito? Nada... A cegueira não permite enxergar os rumos... Há apenas os sons: ora alertam, ora encantam... E quem quer ouvir?

Tantas mãos estendidas e como uma única pode preencher cada palma aberta? Desce a mão sobre a própria fronte e medita dia e noite... Quem sabe a Luz venha e revele cada pedra de tropeço pelo caminho.

O frio dói cada vez mais por causa da grandeza da Solidão. As ruas estão superlotadas, mas veja quanto acre de terra entre um e outro alguém! Nos cânticos de uma suposta liberdade, chacoalham as cercas e tremem os muros em todos os seus diâmetros. São exatamente quantos m³ de Ilusão em cada um destes recipientes?

Aprisiona o precioso ar em um balão e solta-o... Não sabe onde vai... O vento o sopra para onde quiser assim como a folha seca que leva... Vaga sob olhares indiferentes...Não importa onde vai parar. No final, o fim é um recomeço. Um ciclo constante e repetitivo que também é pura ilusão. Há de ter alguém que sinta a mesma coisa todo santo dia de sua longa existência?

A Cotovia saúda o Sol com a mesma velha canção. O rio ainda segue seu mesmo curso não importa quantas sejam as tentativas de matá-lo. As flores nunca se cansam de abrir, murchar, morrer e renascer. Ciclos intermináveis... Parecem - tão somente parecem - tão iguais. Mas ontem senti o ardor do Sol e á noitinha o frio inchava meus poros. Logo, logo vai chover, pois a garoa já cai. 

Para meus ouvidos a Cotovia não canta todos os dias, pois eu nunca a posso ouvir. Nem ver. Não existe rio se não está ao alcance de meus olhos. As flores sempre irão surpreender porque são a cor viva que se destaca no verde que é tão o mesmo...Sempre o mesmo verde...

Não vi o Sol nascer, mas senti o seu calor. E mesmo que as sombras cubram a Terra trazendo a noite, ainda assim ele estará lá."

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O trabalho Sentidos de Shimada Coelho foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição - NãoComercial - SemDerivados 3.0 Não Adaptada.

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